quarta-feira, 1 de outubro de 2014

“Antonimamente”

Sempre achei que António José Seguro não tinha vida para líder do PS. Sempre me pareceu demasiado ingénuo para uma máquina trituradora como são as máquinas partidárias dos partidos do chamado “arco do poder.

Toda a gente anda a dizer que ele foi afastado porque não teve uma vitória retumbante nas europeias. É parcialmente verdade, no que toca aos militantes e simpatizantes de base do PS, mas ao nível das cúpulas a razão do seu afastamento não teve nada que ver com isso.

Vamos por partes. Para os militantes e simpatizantes do PS já era mais ou menos óbvio e dado como assente que Tó-Zé Seguro muito dificilmente poderia ganhar as eleições legislativas, mais parecia ir de vitória em vitória até à derrota final, portanto mais valia mudar já, aproveitando a magra vitória nas europeias que depois da derrota nas Legislativas.

Mas não foi isso que fez avançar António Costa, aliás, nem foi por isso que fizeram avançar António Costa.

Costa hesitou, como vinha hesitando já há algum tempo, porque tinha a noção de que o ideal para si era avançar a quatro ou cinco meses das Legislativas. Costa sabe que a partir de agora tem de falar sobre tudo e não apenas sobre o que lhe interessa e isso vai expor, como expôs durante a campanha interna, que ainda tem menos ideias para o país do que Seguro. Mas o calendário eleitoral não dava mais nenhuma hipótese e com Guterres a avançar para as Presidenciais, nada mais restava a António Costa que avançar agora, porque sabia que se Passos Coelho se apanha com um novo mandato sem troikas e com o défice controlado fica lá mais 8 anos e Costa nunca passaria de Presidente da Câmara de Lisboa, coisa de que já está mais do que farto.

Portanto este era o momento possível para defrontar o adversário no seu momento mais frágil, depois de um programa de ajustamento muito penoso para todo o país e contando com a falta de memória e de entendimento características dos portugueses que culpam o médico pela dureza do tratamento necessário em lugar de culpar o vírus que os fez adoecer.

Costa sabe e a “entourage” que o apoiou também, que as Legislativas não são favas contadas, há muita gente que apesar de estarem zangados com os sacríficios até percebem que não havia alternativas e acima de tudo não querem voltar a ter de passar por tudo de novo, coisa que as promessas de Costa e os rostos que o rodeiam começam a deixar antever. E aqui é que vai estar o grande problema de Costa, promessas de baixa de impostos e de aumento da despesa cheiram a nova troika passados um o dois anos, mas como é que ele vai conquistar votos se disser o mesmo que Passos Coelho vem dizendo há três anos? Para além disso a sua equipa vai exigir promessas mirabolantes para maximizar as hipóteses de vitória, independentemente do for para fazer a seguir.

Para Costa é assim um jogo de vida ou de morte, mas para o “inner circle” de apoiantes é uma situação de ganha-ganha e por isso o empurraram com tanto empenho.

Se olharmos para quem o rodeia vimos voltar os rostos do Guterrismo e do Socratismo, não há renovação, há sim o voltar ao passado, a renovação estava a ser feita por Seguro e por isso se tramou.

Nas Legislativas elegem-se deputados, que nas últimas décadas foram escolhidos pelos homens fortes de Guterres e de Sócrates, que eram os mesmos, mais coisa, menos coisa, mas que não eram os homens de Seguro e portanto haveria uma forte renovação no grupo Parlamentar do PS, quer em caso de vitória, ou de derrota, nas próximas Legislativas. Mas quem está no poder não o cede sem luta, por isso os velhos rostos do poder socialista apoiaram e empurraram Costa para a frente, porque assim eles mantêm, pelo menos, a capacidade de escolher os deputados com todo o poder e influência que isso significa.

Seguro foi simplesmente vítima das circunstâncias, de ter de liderar o seu partido depois da derrota do pior governo que há memória nas últimas décadas e de ter querido efectivamente renovar os rostos do poder socialista sem ser primeiro-ministro. Ingenuidade bem-intencionada, mas politicamente fatal.

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