sábado, 16 de agosto de 2014

M’espanto às vezes, outras m´avergonho

O Tribunal Constitucional é o mais incrível órgão que alguma vez existiu, ultrapassando de longe o Conselho da Revolução. Os seus membros são sem sombra para dúvida as mentes mais evoluídas e sabedoras de todo o planeta e arredores.

Ficámos a saber que uma norma é constitucional ou não em função da situação do país. Hoje não é inconstitucional, mas daqui a dois anos já é. Eu, inculto, pensava que a Lei era universal e que o que hoje é ilegal, amanhã também o será, ou vice-versa, a não ser que a Lei seja alterada. Mas não, pelos vistos não é assim, tudo depende da opinião dos doutos Juízes, não do texto da Constituição.

Mas o mais surpreendente ainda é que a inconstitucionalidade daqui a dois anos, mais uma vez não tem nada que ver com a constituição, mas sim com a previsão económica e financeira de que o país estará em condições de cumprir as regras do défice no seio da União Europeia.

Portanto, se o país estiver em dificuldades para cumprir as metas do défice não é inconstitucional, se não estiver já é. Imaginem que este vosso amigo é tão burro que pensava que o legal ou ilegal tinha que ver com a Lei e não com a opinião sobre o estado do país dos doutos Juízes do Tribunal Constitucional. Sinto-me envergonhado por tamanha falta de conhecimentos.

Mas o que me deixa ainda mais pasmo, porque não conhecia o dotes divinatórios e os méritos económicos dos doutos juízes, é a certeza de que em 2016 teremos um défice dentro dos limites previstos. Que pessoas fantásticas, como é possível que nós, aberrações da natureza certamente, ainda não lhes tenhamos entregue o governo do país e andemos para aqui às voltas com uma crise que estes senhores já sabem que vai acabar daqui a dois anos e que, certamente, também saberão como providenciar o dinheiro que Portugal precisa para pagar as suas contas, para acabar com a austeridade, repor o nível de vida e colocar-nos a todos a viver num país onde corra o leite e o mel.

Temos tais excelsos cidadãos, que alguns ainda têm a desplante de criticar, subaproveitados a verificar a legalidade de diplomas e outras minudências, o que até submete os doutos Juízes à violência de terem de justificar a sua superior opinião com base num texto constitucional feito por seres menores que se esqueceram de consagrar que a opinião dos doutos Juízes é que é lei e não o próprio texto da Constituição.

Francamente, que povo somos, como já alguém disse há uns séculos, não nos governamos nem nos deixamos governar.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Bom Banco…Mau Banco

Esta solução encontrada para não deixar cair o BES e mergulhar o país em mais uma crise bancária, até ver, parece bastante razoável.

Na realidade o que está a ser feito é separar em duas instituições o bom e o mau em termos bancários.

O bom banco, chamado Novo Banco, livra-se de todos os activos tóxicos ligados ao Grupo Espírito Santo, ao Banco Espírito Santo Angola e aos negócios de Miami, ficando com o restante que são bons activos e garantem a solidez financeira.

Claro que ao sair a estrutura de capital, os accionistas, o Novo Banco precisa de ter um reforço de capitais próprios, também aqui a solução me parece muito aceitável, não há encargos para o erário público, isto é para os contribuintes e usa-se essencialmente a linha de recapitalização financeira para os bancos, vinda dos tempos da troika, que também não pode ser utilizada para mais nada e dentro de seis meses quem comprar o Novo Banco vai ter de pagar, pelo menos, esses 4,9 mil milhões, mais juros.

A situação menos confortável é para os pequenos accionistas do BES, que vão ver as suas acções “congeladas”, são retiradas de Bolsa, ficam no Mau Banco e na prática para já vão perder esse dinheiro. Obviamente que quem compra acções sabe ao que se arrisca, mas aqui há uma diferença entre os grandes accionistas, com voz na administração e Assembleia Geral e os pequenos que nada tiveram a ver ou sequer puderam estar bem informados da forma como o Banco estava a ser conduzido.

Para os accionistas, grandes ou pequenos, a única esperança de um dia reaverem o seu capital seria o Mau banco conseguir sair da actual situação, coisa obviamente muito difícil e eventualmente impossível, muito embora, se o Bom Banco for vendido por mais do que o valor de recapitalização, o excesso vá para o Mau Banco, não creio que seja suficiente para ajudar a situação, na realidade o Mau Banco é para liquidar, sendo os seus accionistas os únicos prejudicados.

Em resumo, o BES faliu, os seus accionistas vão perder os seus capitais e suportar esses prejuízos, por outro lado cria-se uma nova instituição, com os activos bons do BES que vais ser vendida daqui a seis meses, mantendo-se a seguranças dos depósitos, os postos de trabalho e o normal funcionamento do banco que foi o BES.


Ficam no entanto dois alertas, um para o Banco de Portugal, sobre a eficácia da sua regulação e fiscalização e outro para os pequenos accionistas de qualquer banco, porque não estão protegidos por serem pequenos, assumem a mesma responsabilidade que os grandes se as coisas deram para o torto, o que poderá vir a causar maiores dificuldades em futuros aumentos de capital dos Bancos, visto que os pequenos investidores vão por certo recordar esta situação e retrair as suas participações, se até lá não surgir alguma salvaguarda relativamente a estes tal como acontece em relação aos pequenos depositantes.