Como já tenho escrito aqui várias
vezes, a economia não é uma ciência exacta, dá muita margem para opiniões e
posições, por vezes diametralmente opostas, como solução para o mesmo problema.
Mas há conceitos, princípios, bases, que são universais.
No jogo do risco, dos
empréstimos, sejam a particulares, empresas ou países, a expectativa de
evolução da situação económica, o comportamento esperado e capacidade de gestão
dos recursos de que dispõem, a vontade e a consciência da enfrentar as
fragilidades, são factores que determinam o custo do dinheiro. Os juros a pagar
são sempre um jogo de expectativas e ninguém empresta dinheiro sabendo de
antemão que a probabilidade de não o receber de volta é elevada, especialmente
se houver histórico de uma situação dessas.
Os signatários do famoso manifesto em defesa
da reestruturação da dívida também sabem isto. No entanto, por senilidade ou má-fé,
ou outros motivos ainda piores, vieram colocar em cima da mesa a única questão
de que neste momento nem queremos ouvir falar, a pior proposta que se poderia
fazer neste momento em que recuperámos a confiança de quem nos empresta o
dinheiro que precisamos porque continuamos a gastar mais do que produzimos
Em bom rigor, Portugal tem vindo
a reestruturar a sua dívida, tem vindo a alargar os prazos, a reduzir os juros,
mas não com o conceito de que não pode pagar e nunca de forma aberta no mercado
financeiro. É algo que se faz operação a operação, negociando sigilosamente com
os credores e substituindo dívida que se vence por outra em melhores condições.
Isto também os signatários do
manifesto sabem, como sabem que é assim que as coisas se fazem, não através de
uma declaração pública que só iria dar motivos para os especuladores fazerem
subir os juros da dívida, que estão cada vez mais baixos e começam a ser
sustentáveis, o que reforça a desadequação da proposta e a sua completa
inconveniência.
Mas há mais, uma boa parte da
dívida está em mãos dos bancos nacionais, obrigados pelo anterior governo a
comprar dívida pública e da própria Segurança Social. Não pagar, reestruturar a
dívida reduzindo ou eliminando esses pagamentos seria lançar para a falência
imediata os principais bancos e a Segurança Social, com consequências
completamente desastrosas para o país. Então sim teríamos uma crise para mais
de uma década, com cortes insustentáveis do ponto de vista social e condenados
a uma quebra de bem-estar que nos colocaria ao nível de países do chamado terceiro
mundo.
E mais uma vez, os signatários do
manifesto também sabem isto, como sabem tudo o anterior, pelo que de novo não
se percebe que raio de intenções os animaram a produzir tamanha imbecilidade,
ainda para mais quando estamos perto de uma saída limpa do programa de
assistência financeira, neste momento é quase um crime contra o interesse
nacional.
Já todos percebemos que mais
tarde ou mais cedo vai ser necessário repensar a questão das dívidas soberanas
dos países da União, vai ter de ser feito em conjunto e com medidas cautelares
assumidas nas Constituições dos diversos países, como até já defendi neste
espaço, mas nunca unilateralmente. Até lá, por muito que custe aos signatários
do manifesto, vão ter contribuir como todos nós para ir amortizando a dívida,
aliás, a dívida que a sua geração criou, não vai conseguir saldar e vai deixar
de herança para os filhos e netos pagarem.
*Artigo de opinião publicado na imprensa local.