quinta-feira, 17 de abril de 2014

As Feras

Durante todo o inqualificável processo de exploração mediática da tragédia do meco estive em silêncio.

Já assisti a muitos linchamentos públicos de pessoas pela comunicação social com o simples e degradante motivo de subir as audiências e vender jornais e também já percebi que de nada servem os argumentos mais inteligentes do mundo contra um pouco de estupidez que esteja na moda e seja repetida diariamente pelos órgãos de comunicação social.

Praxei e fui praxado, e nas três Universidade a que estive ligado, quer como aluno, quer como professor, nunca vi nada que remotamente se parecesse ao que era descrito pelos "media" neste caso. Claro que há praxes violentas, que vão muito além do que seria aceitável, mas quase uma espécie de seita secreta de praxes violentas como a que era descrita sempre me pareceu algo inacreditável ou pelo menos muitíssimo improvável.

Agora a Policia Judiciária, uma das melhores polícias de investigação do mundo, vem concluir que a infeliz tragédia nada teve que ver com praxes e que todo o circo mediático montado à volta deste assunto só serviu para atrasar as investigações.

Fizeram-se programas de televisão, debates, reportagens, deram-se quase como provadas uma serie de coisas que pelos vistos não eram verdade, que foram meras invenções de gente com muito poucos escrúpulos, movidos pela ganância do lucro e explorando a emoção da tragédia de várias famílias. O sobrevivente foi caluniado, insultado, fizeram-lhe uma autêntica execução pública da sua personalidade. Afinal, parece que apenas teve um pouco mais de sorte que os seus colegas, mas todo este mediatismo vai marcá-lo para o resto da vida. Só espero que processe todos aqueles que o vilipendiaram e que paguem com língua de palmo as mentiras que disseram.

Este caso é o típico comportamento para que desde há algum tempo venho chamando a atenção. Dada a falta de escrúpulos, de profissionalismo, de carácter de muitos responsáveis de edição e de jornalistas, acreditar naquilo que se ouve e vê sem qualquer prova inegável, apenas com base em rumores, apenas com base em “fontes bem informadas” é estarmos a alienar a nossa consciência, a nossa inteligência e o nosso livre arbítrio.

Esta realidade atinge todas as áreas da nossa vida, todos os dias vimos notícias bombásticas, demolidoras para pessoas ou instituições que apenas se baseiam em boatos, em suspeitas, em previsões, em hipóteses, em futurologia com bola de cristal, mas que nada têm de concreto ou de substancial, mas como as pessoas acreditam em tudo o que lêem nos jornais ou na internet ou ouvem nos telejornais, essas falsidades acabam por se tornar factos nas suas mentes e criar as consequentes reacções de medo, repulsa, crítica, levando-os a formar uma opinião errada, inconsistente e meramente manipulada segundo os interesses que quem promoveu a mentira.

Quando se diz que a comunicação social é o quarto poder, não estamos a ser simpáticos, nem sequer a ser realistas, dada a falta capacidade, de filtro, das pessoas para analisar aquilo que lhe é impingido e com a impunidade com que se mente e se deturpam os factos neste país, a comunicação social não é o quarto, é o primeiro poder porque influencia a opinião e o comportamento de uma população crédula e incapaz de sentido critico em relação ao que considera “notícia”, por muito absurda, falsa ou manipuladora que ela seja.


Disse alguém que a grande falha do 25 de Abril foi a educação, o não ensinar as pessoas a pensar por si…infelizmente é cada vez mais evidente essa lacuna, essa fraqueza, que deixa os cidadãos à mercê das feras da selva que são os jogos de interesses em Portugal.